
Por Andreia Nobre
Quando o amor encontra coragem, ele transforma vidas, rompe barreiras e constrói novos caminhos. Em lares onde o afeto é o alicerce, mães homoafetivas mostram que a maternidade vai muito além da biologia — é feita de escolhas diárias, superações silenciosas e conquistas que inspiram. Nesta reportagem, conheça histórias reais de mulheres que desafiam o preconceito, constroem famílias com afeto e mostram que o amor, em todas as suas formas, é o que realmente importa.
Juntas há 20 anos, Luciana Aparecida Marconi, gerente regional de atendimento dos Correios no interior de São Paulo, e Ana Carolina, mães dos gêmeos Alice e Gabriel, enfrentaram os desafios da maternidade com coragem e parceria. A adoção dos filhos trouxe alegrias, mas também obstáculos: ausência de licença-maternidade, falta de rede de apoio e o medo do desconhecido.
“Eles são nossos filhos do coração. Não houve preparação fisiológica, mas o amor sempre falou mais alto”, conta Luciana.
Nem sempre o acolhimento veio de fora. Um episódio marcante ocorreu na creche, durante o Dia dos Pais. Gabriel, então com três anos, apresentou sinais de ansiedade. A escola, mesmo ciente da estrutura familiar, não soube lidar com a diversidade. “Nos sugeriram não levá-los à apresentação. Foi doloroso. Mudamos para uma escola que celebra o Dia da Família, onde nos sentimos respeitadas.”
Apesar dos percalços, a rotina é bem dividida. Cada uma participa ativamente da educação e das atividades dos filhos. “Transformamos o dia a dia em momentos de afeto e diversão. Criar memórias felizes é o que mais importa.”

Gestação planejada, amor cultivado
No sul do país, Vilmara Flores Bressan, coordenadora de vendas dos Correios, e sua esposa Valeska também trilham o caminho da maternidade. Casadas desde 2021, optaram pela fertilização in vitro. “Foi um processo intenso, mas vivido com muito carinho. Nosso filho nasceu em abril de 2024, na primeira tentativa.”
A chegada de Felipe trouxe alegrias e também reflexões. “Nossa família é como qualquer outra. Mas ainda enfrentamos barreiras, como fichas escolares que não contemplam duas mães”, relata Vilmara.
Mesmo com a rotina agitada, o casal se organiza para garantir presença e afeto. “Queremos educar nosso filho com respeito, amor e valores sólidos. Ser mãe e mamãe é uma construção diária, cheia de orgulho.”
Rompendo barreiras

Guilhermina Dias da Costa, gerente do Centro de Distribuição Domiciliar (CDD) dos Correios em Taguatinga (DF), vive uma história de amor e resistência ao lado de Cristiane Evangelista, sua companheira há 27 anos. Oficializaram a união há uma década, enfrentando desafios como o preconceito familiar e a proteção do filho Guilherme diante de uma sociedade ainda marcada por olhares julgadores.
“Conquistamos nosso espaço com coragem e não permitimos que ninguém ultrapasse os limites da nossa intimidade”, afirma Guilhermina. Para ela, o maior aprendizado é saber que sua família inspira outras ao romper barreiras e mostrar que amor e respeito são os verdadeiros pilares de qualquer lar.
A resistência do amor

Luciane Trierveiler Guimas, carteira no Paraná, vive com Carla Patrícia uma relação marcada por superações. Mãe de Lucas, de 13 anos, ela relata os desafios de adaptar estilos de vida distintos e enfrentar o preconceito — muitas vezes silencioso — no trabalho, na escola e até na família.
“Às vezes, o simples ato de mencionar minha parceira gera reações inesperadas. É um exercício diário de resistência e autenticidade”, diz Luciane. Ela também destaca o estigma enfrentado por ser bissexual: “A orientação sexual não se define pela pessoa com quem se está. Precisamos falar mais sobre isso.”
Na educação do filho, Luciane e Carla priorizam o diálogo, o respeito e o amor às diferenças. “Educar é um ato de empatia. Cada criança tem seu tempo, seu jeito de ser. Nosso papel é acolher e apoiar.”
Adoção homoafetiva
Desde 2015, casais homoafetivos têm o direito legal de adotar no Brasil. A decisão do STF consolidou o entendimento de que o amor não tem orientação sexual. De lá para cá, o número de adoções por casais do mesmo sexo mais que triplicou: foram 143 em 2019 e 401 em 2023, segundo o CNJ.
Entre 2019 e 2024, 1.535 crianças foram acolhidas por casais homoafetivos — 6,4% do total de adoções no período. A maioria foi realizada por casais femininos, refletindo o protagonismo da maternidade nessas uniões.
O processo é o mesmo para todos: entrevistas, cursos, visitas e, acima de tudo, foco no bem-estar da criança. Cada nova família formada é uma vitória do afeto sobre o preconceito.
Apesar dos avanços, o preconceito ainda impõe barreiras. Mas há um movimento crescente de transformação: políticas públicas, campanhas de conscientização e redes de apoio têm fortalecido a maternidade homoafetiva no Brasil.
Dar voz a essas histórias é mais do que reconhecer direitos — é celebrar o amor em todas as suas formas. Porque toda família que ama, cuida e respeita merece ser reconhecida.