Texto por Mayra Guapindaia
Os segundos selos do mundo são brasileiros e foram lançados apenas três anos após seu antecessor, o Penny Black, inglês. Os Olhos-de-Boi, assim chamados devido ao formato arredondado aonde figuravam apenas as tarifas de 30, 60 e 90 réis, entraram em circulação no dia 1º de agosto de 1843, quando atualmente se comemora o Dia do Selo. A data foi escolhida por ser aniversário do selo pioneiro, mas, atualmente, celebra não só os Olhos-de-Boi, e sim todos os selos postais brasileiros e a prática do colecionismo. O surgimento desta comemoração deve ser entendido como um processo histórico, pois a prática de colecionar selos é posterior à criação do mesmo. Ou seja, inicialmente, os selos postais foram lançados como comprovantes de franquia e não como item de colecionismo. As evidências da existência da filatelia no Brasil datam dos últimos anos do século XIX, quando surgiram os primeiros clubes filatélicos (ALMEIDA, 2003, p.28). Além disso, os selos comemorativos, atualmente os mais associados ao colecionismo, apareceram pela primeira vez no país em 1900. Portanto, o surgimento do Olho-de-Boi e o entendimento do 1º de agosto como um dia para comemorar todos os selos do Brasil não são eventos coincidentes e a comemoração é uma construção posterior.
A primeira celebração do “Dia do Selo” foi uma concepção do período do Estado Novo, no governo autoritário de Getúlio Vargas (1937-1945). O surgimento do selo brasileiro foi lembrado em 1943, por conta do seu centenário, em um bloco no qual, além da releitura dos Olhos-de-Boi, pode-se ver a figura de D. Pedro II ao lado de Vargas. Percebe-se que, apesar do foco ser os primeiros selos postais, já há uma extrapolação da temática para todos os selos, conforme pode-se observar no título “1º Centenário do selo no Brasil”. Além disso, é evidente o caráter personalista da peça, típica do período do Estado Novo. A equiparação de D. Pedro II e Getúlio Vargas atendia à lógica da época que dava destaque para as ações daqueles entendidos como os “grandes homens” da história, normalmente associados a eventos políticos.
A tendência de utilizar o aniversário do 1º selo brasileiro para abordar a filatelia de forma mais ampla afirmou-se ainda mais na emissão de 01/08/1953, lançada em homenagem ao Dia do Selo e para marcar a 1ª Exposição Filatélica Nacional de Educação do Rio de Janeiro. Ou seja, vemos a data, o aniversário do Olho-de-Boi, associada a outros elementos do universo filatélico, neste caso, uma exposição.
Em 01/08/1961 são lançados selos bastante curiosos, os quais confirmam ainda mais a construção de um novo sentido de comemoração mais alargada. A emissão celebra o centenário dos “coloridos”, emitidos na época do Império, posteriormente aos Olhos-de-Boi. Percebam, contudo, que esta releitura foi lançada justamente no aniversário do primogênito. Isso indica clara extrapolação do Dia do Selo para algo além da celebração da primeira emissão brasileira. Vale ressaltar que os “coloridos” entraram em circulação não no dia 1º de agosto, mas em 22 de julho de 1854, para portear cartas para a França (valor de 280 réis) e outros países da Europa (valor de 430 réis) (RIBEIRO, 2003). Contudo, eles foram homenageados por conta do seu centenário no 1º de agosto, já então consagrado como o “Dia do Selo Brasileiro”.
Selos lançados em 01/08/1961 – Centenário dos “Coloridos”
A comemoração se solidificou ainda mais nos anos posteriores. Especificamente, foi a partir de 1968 que se tornou comum a emissão de um novo selo em todo 1º de agosto. Daí em diante, emissões relativas ao Dia do Selo passaram a ser anuais e frequentes até 1982. (SOUZA, 2006, p. 230).
Interessante notar que a emissão de 1968 traz outros elementos da história postal que ajudam a compor a própria narrativa do selo, entendido como parte de um contexto mais amplo: uma caixa de correspondência do Império colocada sobre um fundo com os contornos de um envelope. O texto do edital, menciona “o famoso” Olho-de-Boi, adjetivo escolhido para exaltar a experiência brasileira de ter emitido o segundo selo postal do mundo. Mais do que nunca, os selos daquele ano em diante tiveram o propósito não de relembrar a primeira emissão brasileira em específico, mas sim chamar a atenção para a filatelia de um modo geral.
Apesar das várias releituras do selo pioneiro lançadas em alguns 1º de agosto, isso não se tornou regra, havendo espaço para outras imagens relacionadas ao universo do selo e da filatelia. Como boa parte das datas comemorativas, também o Dia do Selo foi uma construção posterior ao fato, e os sentidos atribuídos à celebração passaram a se alargar para englobar questões relacionadas ao presente, ou seja, a necessidade de se divulgar a filatelia brasileira como um todo. Inclusive, o artifício de homenagear o jubileu de outros selos, como em 1953, foi novamente utilizado em 1981 (Centenário do selo D. Pedro II “Cabeça Pequena”) e 1989 (120 anos da emissão D. Pedro II).
Alguns selos em homenagem ao Dia do Selo lançados nos anos 1970 e 1980
Se as emissões do “Dia do Selo” muitas vezes não trouxeram em sua arte o Olho-de-Boi, também a homenagem a ele não se restringiu ao seu dia. Podemos perceber que ele aparece em artes que comemoram outras datas, como aniversários de clubes e sociedades filatélicas e em emissões que divulgam exposições, o que acabou por interligar ainda mais a imagem do selo pioneiro brasileiro ao colecionismo. Abaixo podemos ver algumas emissões que trazem o primeiro selo, mas que não foram lançadas no dia 1º de agosto. O destaque vai para o bloco do centenário do Penny Black, lançado no aniversário do selo inglês, que figura ao lado de uma releitura do exemplar de 30 réis.
Outro importante conjunto de selos diz respeito àqueles que foram lançados para anunciar exposições filatélicas como a Brasiliana e a Lubrapex. Esse são os casos de emissões de 1993, e de uma série mais recente, lançada entre 2011 e 2013. Somente no primeiro selo da série, de 2011, não há a associação ao Dia do Selo, pois a imagem de 60 réis foi usada para marcar o aniversário da Sociedade Filatélica Brasileira, e por isso o lançamento se deu em 18 de novembro daquele ano. Contudo, os próximos selos e blocos foram lançados todos em 1º de agosto, trazendo também o elemento de divulgação da Lubrapex 2012 e Brasiliana 2013.
Por meio da análise desse conjunto de selos lançados ao longo do tempo, foi possível perceber que o Dia do Selo, tal como conhecemos hoje, juntamente com os elementos que a data evoca são sobretudo fruto de um processo histórico. Especificamente, a comemoração é uma concepção do século XX, quando então se tentava promover a filatelia para alcançar mais pessoas. Certamente não foi pensada pelos homens de 1842. Os primeiros passos para a construção da data se derem na celebração do centenário dos Olhos-de-Boi. A partir daí, e cada vez mais, esta se tornou um evento universalizado, usado para construir novas celebrações da cultura filatélica brasileira.
Referências:
ALMEIDA, Cícero Antônio de. Os correios e os selos postais no Brasil. In:_______; VASQUEZ, Pedro KARP. Selos postais do Brasil. São Paulo: Metalivros, 2003, p.60-75.
CYRELLI, Hellder de Souza. Os cartões de visita do Estado. A emissão dos selos postais e a Ditadura Militar Brasileira. UFRGS, tese de mestrado. Porto Alegre, 2006.
RIBEIRO, Antônio Sérgio. Olho-de-Boi, o primeiro selo do Brasil, completou 160 anos. Disponível em: https://www.al.sp.gov.br/noticia/?id=281158
SÃO LINDOS OS DETALHES MARAVILHOSOS, GRANDES ARTISTAS E GRANDE HOMENAGEADOS TAMBÉM .
Vou enviar aos meu alunos nesta semana, junto a 49 selos diversos, brasileiros e universais, o bloco B-72, comemorando o Dia do Selo, dentro do meu projeto “Selo na Sala”. Tenho certeza de que os ajudará a passar por esse momento doloroso manusear seu pequeno classificador com mais esses selos. Desse texto vou enviar o link aos familiares dos alunos, além de uma página impressa com a introdução e algumas imagens. Precisamos fomentar o colecionismo entre nossas crianças.
Zeca Rocêro (Proj. Selo na Sala)
Prezado Senhor José Carlos,
Parabéns pelo projeto e sempre ficamos muito felizes com iniciativas de incentivo a filatelia.
Saudações filatélicas.