Gabriela Melo
Jéssica e Zoé são melhores amigas, daquelas inseparáveis. Passam quase 24 horas juntas, todos os dias. Com apenas 5% de visão em cada olho em decorrência de uma toxoplasmose congênita, a jornalista de 39 anos é apaixonada por sua border collie, que tem quatro anos e foi treinada por ela mesma para ser cão-guia. Por isso, elas andam juntas para todos os lugares na cidade onde moram, Aracaju (SE), inclusive nas agências de Correios, onde Jéssica – usuária assídua dos serviços postais – costuma enviar encomendas e também cartas manuscritas para amigos que moram longe.
Considerando a existência de uma lei federal que assegura o acesso do cão guia a qualquer ambiente, a situação de Zoé é especial, mas em toda a rede de atendimento dos Correios animais de estimação são bem vindos. Desde 2021, a empresa aderiu ao movimento pet friendly nas agências, onde é permitido o acesso de cães ou gatos de pequeno porte, desde que acondicionados em caixa de transportes ou com coleira e guia. Os animais devem ser conduzidos por pessoas com tamanho e força necessários a mantê-los sob controle.
A permanência dos bichinhos de estimação na agência não pode prejudicar a comodidade e a segurança de clientes e colaboradores. “Cães e gatos são parte da sociedade, que pode ser definida como o conjunto de espécies distintas vivendo em um mesmo ambiente. Assim, para mim, não faz sentido proibir a entrada deles nos estabelecimentos. Em contrapartida, o animal precisa saber respeitar aquele ambiente, o espaço do outro. Por isso é tão importante socializá-lo e apresentá-lo gradativamente a estímulos externos”, opina a jornalista e estudiosa do assunto.
“Onde Zoé não é bem vinda, eu não posso estar. Ela me acompanha em todos os locais públicos e privados de uso coletivo, conforme a lei do cão-guia, mas também em ambientes pet friendly, desde que sejam seguros e garantam o bem estar dela, como é o caso das agências dos Correios. Zoé melhora minha mobilidade, me traz autonomia e segurança”, reforça Jéssica, que anda pensando em encomendar selos personalizados com fotos de Zoé para celebrar os cinco anos da sua companheira. A sintonia entre elas é tanta que as duas fazem aniversário na mesma data.
O melhor amigo dos cachorros: o carteiro
No imaginário popular, carteiros e cachorros não seriam os melhores amigos. Contudo, a realidade mostra que essa relação é bem diferente. Um exemplo disso, é o carteiro Danilo Braga dos Santos Vieira (43), que trabalha na agência da cidade de Divino de São Lourenço, na região do Caparaó, no sul do Espírito Santo, e mora na cidade vizinha, Guaçuí.
Desde a infância Danilo aprendeu a amar e respeitar os animais com seus pais. Hoje ele tem uma gata e oito cachorros em sua casa, todos resgatados das ruas. E todo esse amor pelos animais, especialmente os cachorros, transcendeu os muros da casa do carteiro e se consolidou em projeto de resgaste de animais abandonados nas cidades de Guaçuí e Divino de São Lourenço/ES, que é executado desde 2021.
Em 2021, no trajeto entre o trabalho e sua casa, o carteiro Danilo constatou que dois filhotes, que habitavam as margens de um riacho, poderiam correr riscos, pois havia possibilidades de chuvas e, se o nível da água subisse, eles poderiam se afogar.
Danilo não pensou duas vezes e os levou para casa. Até então, o carteiro não atuava como protetor de animais, apesar de sua devoção pelos bichos. Quando chegou à sua casa, conseguiu um lar para um dos filhotes e o outro foi adotado por ele e sua esposa. Naquele dia, havia ocorrido o falecimento do ator Paulo Gustavo e o cãozinho foi batizado com o nome do humorista, como forma de homenagem.
Naquele mesmo período, Danilo contraiu covid-19. Foi internado e passou um mês intubado na UTI. Quando se recuperou e voltou para casa, Paulo Gustavo, o cão, havia se tornado um grande parceiro de toda a família. A partir daí, Danilo resolve desenvolver um projeto de resgate de animais abandonados, divulgando as ações por meio das redes sociais. Começa aí o Projeto Paulo Gustavo Pretinho.
De 2022 até hoje, dezenas de cachorros foram resgatados por Danilo, das ruas de Guaçuí e cidades vizinhas, e receberam alimentação, tratamento veterinário, medicação, banho e higienização, a oportunidade de ganhar um novo lar, além de muito amor e carinho.
Histórias de sobrevivência e resgates
Além dos animais que encontra abandonados nas ruas e no seu trajeto diário entre Guaçuí e Divino de São Lourenço, o carteiro Danilo, após ter se tornado protetor, recebe frequentemente denúncias de maus tratos animais. São casos de agressões, animais acorrentados sob o sol, e diversas outras situações.
O caso mais recente é de um cachorro que recebeu o nome de Gasolina. Uma pessoa tentou matar o animal e o atingiu com uma pancada na cabeça. No local da pancada, abriu-se uma ferida muito grande. Danilo encontrou o animal ferido e buscou tratamento para ele.
Com o passar dos dias, o ferimento foi cicatrizando e Gasolina se recuperou totalmente. Contudo, uma nova preocupação surgiu. Como se tratava de uma animal de rua e não havia identificação do agressor, colocá-lo na rua novamente poderia significar ameaça à vida de Gasolina, pois ele poderia ser agredido outra vez.
Desde então, Gasolina está abrigado temporariamente na casa de Danilo e o protetor está à busca de um lar definitivo para que o animal possa receber todo o amor e carinho que merece.
Adoção responsável
Uma das grandes dificuldades para se conseguir um lar definitivo para os animais resgatados, segundo o carteiro Danilo, é conscientizar as pessoas que é necessário ter responsabilidade com o animal que está sendo levado para casa.
“Procuro adoções responsáveis, de pessoas que vão dar amor para esse animal, porque ele devolve amor. Ninguém precisa ensinar ele dar amor, ele vai respeitar, vai amar o tutor dele e se tornar um filho de quatro patas” destaca Danilo.