Troca de cartas ganha adeptos durante pandemia

A publicitária Mariana Carolina Carneiro é a idealizadora do grupo de trocas de cartas Envelope de Papel. Foto: Divulgação/Correios

Em tempos de distanciamento social, a necessidade de encontrar outras formas de se conectar com as pessoas se torna cada vez mais pulsante. Na contramão das comunicações digitais, tão impalpáveis quanto instantâneas, um hábito por muitos já esquecido tem conquistado novos adeptos: a troca de cartas – um hobby que, curiosamente, se dissemina nas redes sociais, amenizando a solidão do confinamento.
 
A troca de cartas é capaz de trazer muitos benefícios, como explica Mariana Carolina Carneiro, 23 anos, publicitária, idealizadora do grupo de trocas de cartas Envelope de Papel, que tem quase 2 mil participantes cadastrados de todos os lugares do Brasil e até de outros países. “Esse hobby ajuda a exercer a paciência, já que as cartas não possuem a instantaneidade dos aplicativos e redes sociais, e exigem do destinatário esperar dias e até meses para receber sua correspondência. Também estimula a criatividade, além de promover um carinho especial entre os participantes”, destaca.

Para a mineira da cidade de Santa Luzia, que fica na região metropolitana de Belo Horizonte, receber uma carta cheia de carinho é um ato de amor dedicado, muitas vezes, a uma pessoa que você nunca viu. “Cartas transmitem uma mensagem mais sincera e carinhosa do que um e-mail ou texto em aplicativos como WhatsApp e Telegram. Além disso tudo, ainda há a chance de criar amizades verdadeiras através do papel e caneta”, explica.
 
De acordo com a publicitária, durante a quarentena, houve um aumento significativo de inscrições no grupo. “Começamos o ano de 2020 com menos de 600 participantes e entramos em setembro com mais de 1800. O interesse pela troca de cartas, para muitas pessoas, começou justamente durante a pandemia”, informa. Mariana conta que se inspirou no seu pai, que nas décadas de 80 e 90 trocava cartas com pessoas de vários países, para criar o Envelope de Papel. “Ele me incentivou a procurar grupos que ainda mantinham esse hobby; e, em 2017, resolvi criar meu próprio clube e ser uma ponte segura e fácil para a troca de cartas entre as pessoas”.
 
E foi nesse clube criado pela publicitária mineira que Lidiane Marques Barbosa, instrutora da seção de treinamento dos Correios de Goiás, conseguiu retomar sua antiga paixão, em fevereiro deste ano. “A escrita de cartas já faz parte da minha vida desde os 13 anos, quando comecei a trocar cartas por meio de uma seção do Jornal O Popular. Nessa época, eu mantinha cerca de 40 correspondentes do Brasil e do exterior. Conservei essas amizades até entrar na universidade, mas muitos se mudaram e fomos perdendo o contato. Nos anos seguintes, tive apenas alguns correspondentes esporádicos, que encontrei nas redes sociais”, comenta Lidiane.

Lidiane Marques Barbosa: paixão por cartas e pelos Correios. Foto: Divulgação/Correios

A instrutora dos Correios confessa  que a decisão de trabalhar na empresa foi influenciada pelas cartas. “Quando surgiu o concurso em 2011, eu nunca tinha imaginado trabalhar nos Correios, pois minha área de formação inicial não tem tanta relação com a empresa. Mas sempre fui apaixonada pelos Correios como cliente, porque usava os serviços de correspondências. Então, minha prima fez a inscrição e comentou comigo. Quando ela falou sobre o concurso, lembrei disso e resolvi me inscrever. Há 8 anos faço parte da história dos Correios como empregada. É a junção de duas coisas que sou apaixonada: escrever cartas e trabalhar nos Correios. Lidiane Marques é graduada em Zootecnia e Biologia e possui duas pós-graduações na área de Educação. Ela entrou nos Correios, em 2012, como atendente e, desde 2016, está na área de Educação como instrutora.


 
Além de Lidiane, outro empregado dos Correios de Goiás que também participa do Envelope de Papel é o técnico operacional, Thiago Perné Santos, que entrou no grupo em setembro de 2019. Assim como a instrutora, Thiago já tinha o hábito de escrever cartas desde criança, influenciado pelo caderno “O Almanaque”, do jornal O Popular. “O costume de escrever cartas ficou guardado por um tempo, já que a tecnologia proporcionou facilidades na comunicação. Agora estou muito feliz de estar trocando cartas novamente. É bom fazer algo manual e usar a criatividade; também é muito bom dedicar um tempo para alguém. Comunicar-se através de cartas é uma forma de amor muito rara nos nossos dias”, comenta.

Thiago Perné: “Comunicar-se através de cartas é uma forma de amor”. Foto: Divulgação/Correios

De acordo com Thiago Perné, retomar o hábito de escrever cartas aumentou sua admiração e respeito pelos Correios e por todos os colegas envolvidos no trabalho para fazer uma carta chegar ao seu destino. “Muitas pessoas que escrevem cartas têm uma visão equivocada de como funciona a empresa. E fico feliz em esclarecer os fatos”, explica. Para o técnico operacional, além de escrever para alguém, também é muito emocionante receber uma carta.

“Muitas pessoas capricham e me mandam cartas relacionadas a minha surdez, à acessibilidade e até a língua de sinais. Poxa, é muito capricho e amor”, enaltece. Thiago ressalta que a inclusão e a acessibilidade não devem ser encaradas como favor ou dispensáveis. “ Ao receber algo que eu possa ler, já que não posso ouvir bem pessoalmente ou por telefone, fico muito contente. Há pessoas que, mesmo sem saber, estão contribuindo para que eu, um surdo bilíngue, me sinta mais feliz”, revela.
 
Para quem deseja se ingressar nesse mundo da troca de cartas, pode se inscrever no site www.oenvelopedepapel.com.br. Depois, é preciso aguardar até 15 dias para aprovação no grupo. Ao receber a confirmação de inscrição por e-mail, o participante também tem acesso ao seu número de inscrição, que é o seu código de identificação dentro do clube e das listas de endereço.
 
Tradição x tecnologia
 
A comunicação por meio das novas tecnologias chegou também aos Correios, que inseriu outra modalidade de correspondência no serviço: a carta nacional ou mundial via Internet. Para utilizar o serviço, é preciso acessar a loja online dos Correios (shopping.correios.com.br) e digitar a mensagem a ser enviada. A empresa se encarrega de imprimir, envelopar e entregar a correspondência no destino. Apesar de pular a etapa da escrita manual, o serviço mantém viva a tradição da correspondência e se alinha às rotinas online.
 
Quem não abre mão do papel e da caneta, pode incrementar suas cartas com o selo personalizado. É possível criar, por exemplo, um selo com sua própria foto, do seu animalzinho de estimação ou da marca da sua empresa. O selo personalizado é  um produto customizado que transforma a sua imagem em selo postal. Para fazer um selo personalizado, é preciso ir a uma agência dos Correios, levando a imagem que será impressa ao lado do selo, preencher e assinar o Termo de Solicitação do Serviço de Personalização de Selos Postais.